23/08/2011

Abigail

Num exercício proposto no curso de roteiro cinematográfico, construi Abigail, uma personagem que me rendeu o título de "roteirista com teor psicológico", quem sabe uma Lucrecia Martel. Minha profunda admiração ao cinema argentino.

Aqui está a apresentação do personagem e definição da cena (sem tratamento, pois há muitos elementos literários no texto). Resolvi deixar o texto "cru" para evidenciar esse psicologismo.


Abigail

São duas horas da manhã e ela está em seu local preferido: dormindo em frente à tv. Guarda consigo mágoas de anos. Suas rugas, olheiras e os cabelos finos, ralos  e maltratados  são prova de de sua baixa autoestima e depressão.

Abigail é uma pessoa triste que se refugiou na compulsão alimentar. Sempre é a primeira a acordar e a última a se deitar. Seu prazer é comer as sobras, comer escondido e,  por fim, culpar alguém por sua vida de medos e angústias.
Levanta-se do sofá e tentando ser silenciosa, mesmo com seus 100 quilos, vai até à geladeira na esperança de saciar sua fome de ansiedade.
Na pressa de comer sem ser descoberta, lambuza-se com resto de macarrão ao sugo e sem vaidade, limpa sua boca na camisola.
Num momento de lucidez, Abigail percebe o que fez e continua fazendo a si mesma... e chora.
As lágrimas correm seu rosto e misturam-se ao molho impregnado na camisola.
Entregue, seca suas lágirmas e num andar cambaleante, resigna-se de tudo: de sua aparência e de sua vida.
Volta ao sofá e tenta dormir. Amanhã será um longo e triste dia.

Arnaldo Antunes



 Fonte: site: www.arnaldoantunes.com


Arnaldo Antunes brinca com as palavras e divide essa brincadeira com o publico. 
Poema visual - Arnaldo Antunes

Poucos compositores  compõem e decompõem o vocábulo, o verbete, a palavra,  de modo tão significativo e singular como Arnaldo. No seu primeiro trabalho solo (e o meu preferido), Nome, o título evidencia essa relação da música com  a poesia e mostra o eu linguístico e não somente, o eu lírico do poeta-compositor ou compositor -poeta. Bem recebido pela crítica e causando um certo estranhamento por parte do público, Nome é referência artística quanto à estética "músico-literária" .

Segue um dos poemas, que virou canção do cd O silêncio (1996), que mais gosto. 

Macha Fêmeo ( Paulo Tatit / Arnaldo Antunes / Marcelo Fromer )

Macha
Fêmeo
Macha
Fêmeo
Fêmeo
Macha
Cérebra caralha baga saca pescoça prepúcia ossa
Nádego boceto teto coxo vagino cabeço boco
Corpa moço dentra foro moça
Orgasma coita palavro sexa goza
Liberal gerou
Macha
Fêmeo
Macha
Fêmeo
Fêmeo
Macha
Fígada barrigo umbiga perno braça unho mucoso
Axilo nerva pela veio cabela narino porroCorpa moço dentra foro moça
Orgasma coita palavro sexa goza
Liberal gerou
Calço terna saio camiseto vestida cueco bluso
Meio sandálio calcinho cinta sapata casaca luvo
Corpa moço dentra foro moça
Orgasma coita palavro sexa goza
Liberal gerou



17/08/2011

Conjugação

Entre o eu e o nós tem o tu, ele e ela.
Tu sabes que isso é muito, mas muito complicado
Eu conjugo  nós
Tu conjugas eu
E para desatar os nós,
Não basta desenrolar a língua, o verbo
É preciso querer.
Ora o eu apareça
Ora o nós tenha força
E como num cessar-fogo
A paz se estabeleça